Por Josè Joacir dos Santos, fotografia do acervo do autor
Por questões culturais e políticas, a história contada no Brasil e implantada nos currículos das escolas públicas e particulares foi focalizada nas relações Brasil-Europa, seus reinados, ideologias etc. Pouco ainda é contado sobre os países vizinhos e fronteiriços. Sem contar que a história das mais de 100 etnias indígenas puramente brasileiras também é ignorada. Diante desse quadro, tudo o que se refere à história da Europa Central e Asia é quase nulo. Quem sabe alguma coisa que aprendeu na escola sobre um pequeno país asiático chamado Cambodia? Esse buraco cultural, proposital ou não, é uma lástima.
Portugueses e espanhóis, depois os demais europeus que se aventuraram a extrair as riquezas de outras terras, inclusive, as Americas, mantinham suas rotas e descobertas em segredo porque tudo era dinheiro. Apesar de pioneiros no caminho que à Ásia, Portugal não se preocupou em incluir nos livros censurados que chegavam às colônias um pouco da história de suas conquistas, mas também dos povos conquistados. Na primeira fez que fui a Macau uma estudante me perguntou, em português de Portugal, onde ficava o Brasil. Isto é, a nossa história, do lado de cá do Atlântico também foi ocultada.
Com o advento da internet podemos explorar e até nos surpreender com a história de países que nada sabemos sobre eles como o Cambodia. Um personagem brasileiro, de nome estranho traria para Brasilia o que um dos monarcas do Camboja fez no século IX. Juscelino Kubitscheck construiu Brasilia e no projeto original implantou centros de saúde, escolas, biblioteca, quadras de esporte e postos de polícia entre as quadras. Foi uma revolução. Isso existiu no Camboja no século IX. No primeiro milênio de nossa era (Império Khmer, no século IX), monarcas cambojanos, da terra dos quemeres, construíam cidades com abastecimento de água, escolas e hospitais dentro de cada comunidade, e ensinavam nos currículos escolares além de arquitetura, medicina, conhecimento sobre ervas e até sobre doenças mentais. Cada vila tinha suas escolas, hospitais e farmácias. Algumas até tinham centro de estudos avançados. Tinham pleno domínio da fitoterapia daquela região e as ervas eram distribuídas entre as farmácias de casa hospital.
O Camboja, e o reinados dos seus quemeres (khmer), era tão desenvolvido em assuntos humanitários e medicina que os imperadores da China mandavam emissários para literalmente fazer o que eles sempre fizeram bem: copiar tudo. É evidente que reinados caem, como caíram os de Portugal e Espanha. O Camboja guarda ruinas daquilo que se salvou de muitas sangrentas guerras entre reinos e dos bombardeios americanos e dos países vizinhos durante a guerra do Vietnã. Historiados dizem que os bombardeios naquela região foram cinco vezes maiores que os da segunda guerra mundial. O país ainda conta com bombas não detonadas no campo, próximo a vilas, monumentos, reservatórios.
Um dos nomes mais populares da história do Camboja é do monarca Jayavarman VII, que, ao contrário de seus antecessores, estabeleceu uma rede de diplomacia para estabelecer a paz na região. Budista, a preocupação com o bem-estar da população o fez construir uma “extensa rede de estradas foi construída conectando todas as cidades do império, com casas de repouso construídas para viajantes e um total de 102 hospitais estabelecidos em seu reino”, casas de repouso e templos. Os hospitais estavam também conectados com casas de repouso não só dedicadas para peregrinos e viajantes, mas havia aquelas especializadas para doentes mentais tratados com ervas medicinais. Muitos dos países europeus daquela mesma época não tinham nem 10% dos hospitais que o Camboja tinha. Em vez de desenvolver o conhecimento das ervas medicinais que traziam de suas conquistas, a Europa deu apoio para a famigerada inquisição, onde fitoterapeutas, benzedeiros e curadores eram mortos nas fogueiras acesas pela igreja católica (e depois também os protestantes). Hoje o Camboja ainda tem que lidar com muita pobreza, uma herança agravada pelas guerras, especialmente a do Vietnã-EUA. Os monumentos, que teimam em ficar em pé, reproduzem imagens faciais da deusa da Compaixão e Perdão, Kuan Yin, de quem o monarca Jayavarman VII era devoto, no século IX (nove).
Nesse pequeno texto dá para a gente refletir sobre a dedicação da Deusa Kuan Yin (Avalokiteshvara) para com o planeta terra, desde longas datas. Ela influencia seus devotos ou simpatizantes, especialmente já sabendo quem é quem e quem estará a serviço da evolução espiritual da humanidade. Jayavarman VII morreu aos 95 anos, dedicado aos desígnios de sua grande mãe, Kuan Yin, ela que tem a onipresença, a onisciência, tudo ver, de todos os lados e dimensões.
05 de abril de 2025. O Camboja fica entre a Tailandia e o Vietnã