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A masculinidade tóxica como espetáculo na política

Psicologia e Psicossomática

Por Debora Diniz e Giselle Carino, Jornal El Pais.

08 oct 2020 – 17:55 BRT

A bufonice dos dois seria apenas ridícula não fossem os efeitos trágicos nas populações mais vulneráveis e o poder de contágio em outros machos no poder.

“Não tenha medo da covid”, disse presidente Donald Trump pelo Twitter, “não deixe a doença dominar sua vida”. Com a autoridade de um sobrevivente de covid-19, as palavras foram ditas logo antes de sair do hospital. A quem ele se dirigia? Aos milhares de latinos e negros, migrantes e pobres que morreram? Não, esses parecem importar pouco —é gente descartável, cujo luto se ignora, gente sem direito à velório ou obituário. Trump falava para si mesmo e para os que se animam com sua masculinidade onipotente. Ele, o todo poderoso, que desafia a ciência e a verdade.

Jair Bolsonaro, no Brasil, é um entusiasta da masculinidade de Trump. Estuda seus trejeitos brutos e táticas de mentira. Copia até mesmo os arroubos de linguagem no Twitter. Deve estar em gozo, pois pela primeira vez a cartilha sobre como ser um “macho populista doente” saiu do Sul para o Norte—Bolsonaro foi o primeiro a adoecer, depois de descrever a covid-19 como “gripezinha”, e dizer-se protegido por seu “histórico de atleta”. Trump teve de se contentar com o que os médicos descreveram como sendo um senhor de 74 anos e com um certo sobrepeso como fator de risco. Parece que na competição de quem é o macho da vez, Bolsonaro saiu falando grosso.

Enquanto os dois presidentes exalam os traços da masculinidade tóxica como espetáculo na política, os dois países disputam o ranking de tragédia. Segundo os Centers for Disease Control and Prevention, em 5 de outubro, os Estados Unidos tinham mais de 7 milhões de casos e mais 210.000 mortes por covid-19. É o país com maior número absoluto de mortes no mundo. O Brasil nem contar direito seus mortos e doentes sabe fazer. Há sombras sobre os dados repassados pelo Ministério da Saúde, e um consórcio de veículos de imprensa também conta os efeitos da pandemia pelo país. É o segundo país com mais gente morta, são mais de148 mil mortos em 8 de outubro.

Em comum, os dois presidentes fazem da máscara o ícone da masculinidade. Cada qual com seu repertório, é verdade. Trump tenta justificar-se com o léxico liberal da liberdade de escolha, “Você pode usar. Você não tem que usar. Estou escolhendo não usar. De alguma forma, eu não me vejo usando”. Não poderia ser mais deslizante na mensagem de saúde pública, porém eficiente para quem acredita que o “direito de escolha” deva ser um valor, inclusive quando a saúde global está em risco. Presidente Bolsonaro diz que “máscara tem eficácia quase nula”, ou seja, é mais rústico nos modos: desdenha da ciência sem meias palavras. Se Trump apela para o liberalismo da escolha, Bolsonaro para o senso comum de “que todos vamos morrer um dia”. Mais ousado que Trump, termina com um “E daí?” para quem insiste em falar de sofrimento, adoecimento e mortes.

Os dois passearam pelas ruas, fizeram comícios, adoeceram dezenas de pessoas. Foram garotos propaganda da hidroxicloroquina, um tratamento sem comprovação para covid-19. Em junho, o país de Trump doou 2 milhões de doses do medicamento ao Brasil; dias depois, os Estados Unidos suspenderam a autorização para o uso do medicamento em território nacional. O estoque de medicamentos foi descrito como “lixo tóxico” pela professora da Universidade de São Paulo Deisy Ventura. Trump celebra o tratamento experimental que o teria curado de covid-19, enquanto se agitam as controvérsias públicas sobre sua adequação ou mesmo sobre a verdade do protocolo médico adotado para tratá-lo.

A bufonice dos dois seria apenas ridícula não fossem os efeitos trágicos nas populações mais vulneráveis e o poder de contágio em outros machos no poder para quem medidas preventivas em saúde pública são sinais de fraqueza no mandonismo: Boris Johnson (Reino Unido) e Vladimir Putin (Rússia) são outros que sofreram da mesma mazela da máscara. Todos passam a ser heróis de uma guerra particular, a de que os machos não morrem do vírus, de que não há doença tão letal assim, e que o importante para a humanidade é a saúde da economia.

Trump está em corrida eleitoral, e ainda se desconhece o impacto da figura heroica sobrevivente ao vírus. Se Bolsonaro operar mais uma vez como seu tutor na cartilha populista, há o risco de o vírus ser tão simbólico quanto a facada que o transformou no macho mártir. Porém, não há como prever os efeitos do teatro da masculinidade em um momento em que a humanidade sofre. Pode ser que o intercâmbio da cartilha populista não se atualize entre Sul e Norte e que o herói seja só mesmo um bufão sem máscara, arfando para sobreviver no próprio corpo.

https://brasil.elpais.com/brasil/2020-10-08/bolsonaro-trump-e-a-masculinidade-toxica-como-espetaculo-na-politica.html

Masculinidade tóxica

Psicologia e Psicossomática

Nova geração revê ‘masculinidade tóxica’, ensinada desde cedo para 70%, segundo pesquisa. Levantamento entrevistou mais de 19 mil pessoas do sexo masculino e virou documentário

Por Matheus Moreira – Folha de S.Paulo, 30/08/2019, 08.00h

Fui ensinado desde menino que ser homem exige engolir o choro e ser muito forte. Não sou o único.

São Paulo – Uma enquete de âmbito nacional mostra que 72% dos homens brasileiros foram ensinados a não demonstrar nenhuma fragilidade. O problema continua: 60% dos entrevistados também foram instruídos a não expressar emoções. Mas o que é ser homem, afinal? Essa é a resposta que ao menos cem grupos de homens espalhados pelo país procuram. Os encontros são um fenômeno novo no Brasil e buscam construir uma maneira saudável de ser homem usando uma ferramenta potente: a escuta.

Em São Paulo, o terapeuta Fábio Sousa, um homem negro e carinhoso, lidera um desses grupos —do qual faço parte.  O grupo foi fundado em 14 de abril de 2019, quando nove homens se encontraram para discutir seu papel no mundo. Desde então, nós nos reunimos quinzenalmente. “Quando aquela moça foi estuprada por 20 caras eu postei um texto no Facebook dizendo que eu me sentia impotente, que tinha acontecido isso e eu não sabia o que fazer com essa informação. A minha companheira me trouxe várias questões do feminismo e como isso implica na relação com os homens. O grupo surgiu depois que eu falei para ela do caso e ela me questionou: ‘o que você vai fazer com tudo isso?”. De acordo com a enquete “O Silêncio dos Homens”, realizada pelo site Papo de Homem, 60% dos homens gostariam de se juntar a um desses grupos. Em parte isso se deve a solidão —40% dos mais de 19.800 entrevistados por questionário online afirmam que se sentem solitários sempre ou com muita frequência. O nível de confiança da enquete, espontânea, é de 95%, segundo os pesquisadores.

A solidão é algo que conheço bem. Sousa partilha deste sentimento, assim como Guilherme Valadares, editor do Papo de Homem e um dos realizadores da pesquisa e do documentário homônimo. Ele conta que era frustrado por não ter características associadas ao “ser homem”, e por isso se sentia só. A situação escalou e ele se tornou um adulto agressivo nas relações. “Minha performance de masculinidade entrou realmente em xeque depois que conquistei o que, em minha imaginação, me tornaria um homem de verdade. Fui agressivo em minhas relações amorosas, com amigos no trabalho, tive comportamentos autodestrutivos… homem que ‘sente demais’ é estranho, é fresco. Meu mundo emocional era, em grande parte, colorido pela emoção mais socialmente aceita para homens, a raiva”, relata Valadares.

O jornalista e correalizador do documentário Ismael dos Anjos explica por que a violência se tornou uma linguagem da masculinidade tóxica. “Esse homem com comportamentos tóxicos não sabe como, e não tem recursos para conversar, resolver as coisas no diálogo, escutar e entender outras pessoas. O homem está acostumado a se fazer valer no exercício de força.”

Por “masculinidade tóxica”, entende-se um conjunto de hábitos que impõem o machismo, como esperar que mulheres assumam as tarefas de casa, buscar controlar suas roupas e ações, impor a palavra final e tratar mulheres com agressividade física ou psicológica, reduzindo-as (ou tentando reduzi-las) a um papel subserviente.

Sousa diz que o homem perdeu sua função social de provedor, ainda que vivamos em uma sociedade predominantemente patriarcal, “a identidade do homem está ligada às performances de masculinidade. Quando há um movimento contrário é possível que o homem siga por caminho mais destrutivo”, aponta. Não somos ensinados a falar sobre o que sentimos e, de acordo a pesquisa, 40% dos homens nunca ou raramente conversam com amigos sobre seus medos, dúvidas e obstáculos. Seis em cada dez homens afirmam lidar com distúrbios emocionais como ansiedade, depressão, vício em pornografia, insônia, abuso de substâncias, apostas e jogos. Além disso, homens vivem cerca de sete anos a menos que as mulheres e se suicidam quatro vezes mais, segundo o IBGE e o Ministério da Saúde. Para a equipe do documentário, isso pode ser explicado pela ausência da busca por diagnóstico por homens, por medo de aparentar vulnerabilidade e por dificuldade de entender os próprios sentimentos.

Um estudo da Associação Americana de Psicologia aponta que 80% dos homens tem alexitimia, ou seja, são incapazes de reconhecer o que sentem. Na prática, isso quer dizer que medo, frustração, dor, ansiedade, são todas uma única coisa inominável e, portanto, difícil de lidar. Essa dificuldade para expressar sensações pode levar à violência. Os homens são os que mais matam e os que mais morrem. Segundo o Atlas da Violência de 2017, 92% das vítimas dos 61.283 assassinatos no país em 2016 eram homens, e, destes, 74,5% eram negros. O mesmo perfil o perfil dos homens assassinados se repete quando olhamos para os autores destes crimes, de acordo com um estudo da FGV.

Além disso, o número de feminicídios no país também é expressivo. A OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que o Brasil é o quinto país com o maior número desse tipo de crime, que pressupõe a mulher ser assassinada em decorrência de sua condição de mulher. É uma taxa de 4,8 mulheres para cada 100 mil habitantes. Na maior parte dos casos, os agressores são familiares (50,3%) ou parceiros e ex-parceiros (33,2%).

A promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo Gabriela Mansur desenvolveu um projeto para que homens enquadrados na Lei Maria da Penha por agressão a mulheres participem de discussões quinzenais sobre masculinidade e gênero. O projeto se tornou a Lei nº 16.732 de 2017 e já apresenta resultados. A reincidência dos condenados por agressão no âmbito do projeto caiu de 65% para 2%.

HOMENS NEGROS, NÃO HETEROSSEXUAIS E TRANS

Anjos, que assim como Sousa e eu, é um homem negro, aponta que o documentário traz vivências importantes para se discutir o lugar do homem negro dentro da caixa do “o que é ser homem”.  “É comum, entre homens negros, ouvirmos ou sentirmos que, para alcançar a construção do que a gente imagina ser um homem, deveríamos ser duas ou três vezes melhor que os outros. Isso vale para o caminho de ascensão social, de busca por algum sucesso, mas também vale para os estereótipos nocivos ligados às masculinidades, como aguentar o tranco, estar sempre pronto e ativo sexualmente, se impor fisicamente e por aí vai.”

Não se trata de um questionamento novo —o ex-presidente americano Barack Obama, negro filho de mãe branca e pai negro que o deixou na infância, abordava a questão com frequência—, mas que permanece necessário. A masculinidades negra, no documentário, é abordada pelo sociólogo Túlio Custódio. Ele sugere que os negros buscam se aproximar do que é ser homem para deixarem a condição de negros construída por um racismo estrutural. “A categoria existencial do homem é a do homem branco. Esse é o homem ideal. O homem negro nunca vai ser o ideal. Esse negro sempre estará correndo atrás do prejuízo, buscando ocultar o lugar do homem negro e se aproximar do branco”, reflete.

Há também que se falar sobre as masculinidades de homens não heterossexuais e transexuais. Homens trans, por exemplo, se deparam com os padrões de masculinidade se colocam como homens para o mundo. É o que diz Lam Matos, cenotécnico e homem trans. “Quando eu me coloco como homem para a sociedade, ela me cobra uma postura de homem. É muito recorrente entre homens trans que começam a assumir papéis masculinos que parem de chorar. Eu parei de chorar; me vejo obrigado a seguir um padrão para ser aceito como homem”, conta no filme.

O documentário O Silêncio dos Homens estreou nesta quinta (29) em 239 sessões públicas, em espaços abertos, registradas por grupos de homens e mulheres em todo o país. Agora, com o filme pronto e disponível gratuitamente no YouTube, Valadaresme conta que o sonho cresceu. “todo o projeto está conectado ao nosso sonho, um tanto utópico, de ver surgir pelo menos um grupo de transformação das masculinidades em cada um dos 5570 municípios brasileiros.”

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/08/nova-geracao-reve-masculinidade-toxica-ensinada-desde-cedo-para-70-segundo-pesquisa.shtml?loggedpaywall

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